Oi Futuro apresenta “Uma Vida Boa”, peça baseada em fatos reais

Estreia dia 14 de março no Oi Futuro Flamengo a peça “Uma Vida Boa”, com texto de Rafael Primot e direção de Diogo Liberano, patrocínio da Oi e Secretaria de Estado de Cultura, através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura e apoio do Oi Futuro. Baseado em uma história real passada nos Estados Unidos em 1993 “Uma Vida Boa” conta a história de B., que nasceu mulher e assumiu uma identidade masculina. A peça encena as consequências desta decisão, que acabou por levar ao assassinato da protagonista. A história que deu origem a “Uma Vida Boa” gerou um documentário e o filme ‘Meninos não choram’.

B (Amanda Vides Veras) é criada como menina pela família, mas resolve assumir sua identidade masculina, mudar de cidade e acaba se apaixonando por L (Julianne Trevisol), além de fazer amizade com vários moradores da nova cidade, incluindo J (Daniel Chagas), que viria a ser seu assassino, juntamente com um amigo, condenado à prisão perpétua e que segue cumprindo pena (J foi condenado à pena de morte, mas a sentença ainda não foi executada e o caso aguarda revisão). Rafael Primot usou como base para a criação do texto os acontecimentos históricos, através do que foi publicado sobre a tragédia, mas não se preocupou em se manter fiel aos fatos. “Não sou um adaptador, preciso de liberdade para a criação. Eu aproveitei situações reais, mas absolutamente todas as linhas do texto são da minha imaginação, busquei criar uma nova história a partir do real”, enfatiza o autor.

“Esta peça apresenta a história de uma pessoa em busca de ser o que ela é, mas que talvez só ela saiba (ainda)”, pondera Diogo. Nessa jornada, B entra em conflito com sua identidade e existência. “A própria personagem tem preconceito sobre si mesmo. Na tentativa de lidar com aquilo que desconhece, ele busca se encaixar em um padrão socialmente aceito, por uma questão de sobrevivência”, explica Rafael Primot.

Amanda Vides Veras é a protagonista e idealizadora do projeto, ao lado de Pablo Sanábio. A atriz buscava um trabalho que pudesse ter um forte impacto sobre o público e chegou a esta história real, encantada também pela personagem, que considera um grande desafio profissional. “Interpretar um transexual exige uma composição muito delicada e um estudo aprofundado. Li muito sobre o tema, mas o essencial foi conhecer pessoas e me aprofundar em um mundo que talvez jamais conheceria se não fosse esta peça, que já fez de mim um ser humano melhor”, celebra.

Para interpretar protagonista, atriz desenvolveu a musculatura dos braços e usou atadura para prender os seios

Para compor a personagem, Amanda parou de fazer as sobrancelhas, as unhas, cortou o cabelo bem curto e faz, desde o início do ano, um trabalho corporal para ganhar massa muscular, especialmente nos braços, além de usar uma atadura elástica pra prender os seios. A atriz assistiu ainda a uma série de documentários sobre o tema, viu filmes como ‘Tomboy’ e mergulhou em livros como ‘Viagem Solitária’, de João Nery, que julga imprescindível para o seu processo de criação. “A partir dele, pude perceber como este ainda é um assunto desconhecido. Escutamos muito as pessoas se referirem a um trans como ‘aquela menina que se veste de menino’ ou ‘aquele menino que finge que é menina’ e não é isso. É uma pessoa aprisionada no corpo errado”.

A montagem propõe uma discussão ampla, além da questão da sexualidade. “Esta peça não é sobre gênero. Ela precisa ser sobre o humano frente ao que desconhece, sobre o humano espantado e, mesmo assim, disposto a dialogar com aquilo tudo que o assusta, apenas por ser diferente. Precisamos, enquanto seres em sociedade, ultrapassar os nomes das diferenças e trabalhar nossa capacidade não de aceitá-las, mas de saber que elas existem e continuarão existindo”, explica Diogo Liberano. “Quando a gente não sabe lidar com o desconhecido, a primeira reação é de aversão, de ter uma reação violenta a isso. Até na ficção é assim. Quando o extraterrestre aparece, a primeira ideia é bombardeá-lo, não tentar ouvi-lo, conhecê-lo. É fundamental aprendermos a conviver e respeitar o desconhecido, lidar com o que não nos pertence”, complementa Rafael Primot.

O autor não construiu uma narrativa cronológica, mas propôs idas e vindas em um mosaico para articular memória e atualidade. O jogo cênico criado por Diogo Liberano nasce dessa dramaturgia.  “Na memória, a história acontece como se estivesse em looping. O que ocorreu já teve fim, já foi, se completou, então quando estão dentro da memória, as personagens seguem vivendo aquela história tal como ela foi. No espaço da atualidade, flagramos estas personagens no tempo presente, tendo consciência de que a sua história já aconteceu e que hoje, elas podem apenas lembrar dela, tê-la viva em suas memórias. O espaço da memória só está vivo porque as personagens lembram dessa história na atualidade. É um jogo que nos possibilita dinâmicas tempo-espaciais que nos aguçam a transitar pela complexidade dos afetos em curso e, mais que isso, é um jogo que pretende chamar a atenção do espectador não para a história de um crime, mas sim, para uma situação onde vemos o caminho, o percurso pelo qual o ser humano se faz e refaz, um caminho pelo qual capturamos a humanidade sendo trabalhada na nossa frente”, explica Diogo.

Cenografia é inspirada em pinturas de Francis Bacon

A cenografia de Brunella Provvidente é composta por estruturas finas de aço que remetem a portas, janelas e enquadramentos vazados, sugerindo um espaço frágil, tal qual é o espaço tanto da memória, quanto da atualidade. A estética do espetáculo inspira-se nas pinturas de Francis Bacon, por conta de seus corpos estranhos, e propõe um jogo de revelar e ocultar, como vivido por B.

Os figurinos de Bruno Perlatto procuram dimensionar quem são essas personagens. “Pedi que se investigasse a possibilidade de criação de um figurino em camadas. E eis que, por conta disso, acabamos descobrindo que a principal ação física do espetáculo é destruir segredos, para que se tente – a todo e qualquer custo – ser aquilo que se é, sem esconderijos. Assim, a nudez que o espetáculo apresenta vem como interpretação nossa da violência que a história real nos oferece. É violência de todos os tipos: psicológica, física, social. Com uma carga tão grande de violência, ousamos traduzir no tirar das roupas (ou no ter as roupas tiradas) tal violência. Um ato de desnudar significa, para nós, ser violentado”, enfatiza Diogo. A ficha técnica traz ainda Daniela Sanchez (iluminação), Diogo Ahmed Pereira (trilha sonora original), João Pedro (direção de movimento) e Ana Lélis e Paula Rollo (direção de produção).

O texto de Rafael Primot abre uma janela onírica, em um momento crucial do espetáculo, trazendo para a cena um sonho de B, onde ele finalmente realiza um desejo do qual a própria vida o privou. O que poderia ser uma mera licença poética aproxima ainda mais o público da tragédia real que aconteceu com aquela personagem. “O sonho não surge apenas como uma ilusão, mas sobre o que ele gostaria de ser, uma tentativa de se transformar em outra coisa, ainda que idealizada”, justifica Rafael. “O sonho neste espetáculo é o que temos de mais concreto. É o nosso desejo tornado possível”, exalta Diogo.

SERVIÇO
Uma Vida Boa
Estreia – 14 de março (sexta)
Temporada até 25 de maio
Horários: de quinta a domingo, às 20h
Oi Futuro Flamengo
Endereço: Rua Dois de Dezembro, 63, Flamengo
Telefone: (21) 3131.3060
 Preços: R$ 20,00 (inteira) / R$ 10,00 (meia-entrada para idosos acima de 65 anos, estudantes, professores da rede pública e portadores de deficiências)
 Lotação: 63 pessoas
 Classificação indicativa: 18 anos
 Vendas: 4003-1212 / Ingressorapido.com.br

*As informações são de responsabilidade de seus organizadores e estão sujeitas a alterações sem aviso prévio.

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