Depois de inúmeros livros publicados (o primeiro datado de 1912), e claro, outras tantas adaptação aos cinemas que ampliaram (e exploram ao máximo) a história, fica difícil de imaginar que um novo filme sobre a vida do homem da selva mais famoso do mundo consiga abordar algo de novo. Em A Lenda de Tarzan o escolhido para tal desafio foi experiente e competente cineasta David Yates (dos quatro filmes finais de “Harry Potter”), que para apresentar uma releitura convincente do clássico escrito por Edgar Rice Burroughs, escolheu para seu auxilio um elenco conhecido do grande público (e não menos talentoso) e claro, se beneficiou de um orçamento alto a seu dispor (valor estimado em 180 milhões), para apresentar muitos efeitos visuais e cenas de aventura por dentro da selva.
Buscando fugir dos vínculos dos seus antecessores, o filme apresenta (inicialmente) uma continuação direta dos eventos que nós todos conhecemos, aonde a história acompanha a jornada de um casal inglês e seu jovem filho, John Clayton, que acabam desembarcando em terras africanas aonde são acolhidos por tribos locais. Durante sua infância na África, John tinha dificuldade em apreender certos costumes indígenas, mas com a trágica morte de seus pais, ele se vê forçado a se adaptar ao ambiente hostil da floresta para sobreviver e acaba sendo adotado por uma “mãe” que faz parte do mesmo grupo de macacos que havia assassinado seu pai. Anos depois já adaptado na selva, ele acaba demonstrando interesse em se adaptar novamente à vida entre os humanos.
Nesta releitura somos transportados diretamente para década de 1930, aonde a lenda de Tarzan, já não é mais um mistério sendo conhecida e reverenciada (pelo menos na África). Agora Tarzan é um indivíduo civilizado, chamado de John Clayton III (Skarsgård), nosso herói, vive uma vida completamente diferente do seu passado selvagem que lutava diariamente pela sua sobrevivência e aceitação no mundo animal. Casado com amor de sua vida, Jane (Margot Robbie), apesar de aparentemente estar bastante confortável com sua nova vida na burguesia de Londres, internamente carrega as lembranças de seu passado recente. Devido a problemas recentes no Congo, ele acaba sendo convidado para servir como uma espécie de emissário do Parlamento Britânico. É com sua chegada a esse País que a trama se mostra mais clara como uma aventura desenfreada – aonde Tarzan vai em busca (novamente) da salvação da África.
Apesar do roteiro escrito por Adam Cozad e Craig Brewer vislumbrar com a originalidade, ele falha ao não tentar mudar aspectos da estrutura ideológica da história. Passados cem anos da criação do personagem, se imaginaria que uma “releitura” consegui-se representar os eventos e até mesmo a estrutura de forma mais moderna e até mesmo trazendo algumas reflexões políticas, ainda mais se pensando no mundo atual aonde povos (de qualquer nacionalidade) buscam forças próprias para conquistar seus ideais e liberdade. Dizer que o filme não tentou seria uma grande falacia, o próprio vilão do filme vivido por Christoph Waltz, o belga Capitão Leon Rom carrega convicções aceitáveis e até certo ponto atuais como a ganância e sede por vingança. Porém fica evidente que o filme possui problemas em saber qual linha pretende tomar, se faz mais uma aventura do menino que se tornou o Rei da Selva, ou se cria uma trama com personagens mais adultos e denso. No meio dessa indefinição eles acabaram seguindo linhas diferentes e limitando a evolução da trama no geral.
No filme temos como protagonista o ator sueco em ascensão Alexander Skarsgård, que fica responsável de carregar o fardo de viver o lendário herói. Skarsgård executa bem o papel designado, tem o porto físico (uma imponência natural dado pela altura do ator), beleza e talento necessário mas talvez falta um pouco “calor” em sua atuação (mas claro que o próprio personagem e abordagem limita tal ações). Jane, que agora é sua esposa, vivido pela talentosa atriz Margot Robbie (futura Arlequina nos cinemas), segue a linha esperada da personagem com acréscimo do esforço de Robbie em trazer convicção para sua atuação, deixando na tela uma boa química entre os atores. Como alivio cômico temos Samuel L Jackson, que mesmo com um personagem bastante limitado (estranho para dizer a verdade), consegue se impor ao mesmo, artificio usado por Christoph Waltz para criar o vilão perverso e carismático.
Com atmosfera sombria e dando bastante espaço para contrastes, um dos grandes destaques do filme fica por conta da ótima fotografia criada pelo britânico Henry Braham (responsável pelo ainda inédito Guardiões da Galáxia Vol. 2). Todo estudo e composição das cores se tornou muito importante para o filme, pois com ele a equipe de efeitos visuais conseguiu trabalhar as cenas de ação e até mesmo das CGIs do macacos de forma mais eficiente, resultado que podemos ver na tela. Ponto negativo fica para direção de David Yates, que comente o mesmo erro já visto em Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 2, aonde a insistência de criar “quebras de ritmos” ou mesmo viradas na abordagem desnecessárias, faz com que o desenvolvimento de certas cenas se torne frustrante. Como se já não bastasse isso, ele ainda faz o mal uso de câmeras lentas em diversas cenas de ação, não justificando em nenhum momento o trabalho de filmar numa cadência maior que a normal.
A Lenda de Tarzan é mais um filme que teve um ótima oportunidade para trazer uma releitura mais profunda da sua clássica história, talvez com um pouco mais de coragem e deixando de lado as amarras criadas em histórias anteriores, não seria tão difícil apresentar tais novidades. A aventura o divertimento estão nesse novo filme, atuações convincentes e produção competente também, mas fica a pergunta o que realmente esse longa acrescentou na já saturada história? David Yates apresenta um filme que apesar de suas falhas, se mostra bastante atrativo para o público que buscam uma boa diversão sem necessariamente encontrar reflexões sociais e politicas mais profundas. O longa ainda serviu para testar o real apelo de Alexander Skarsgård junto aos fãs, lembro que ele faz sua estreia como protagonista em um blockbuster com apelo mundial.