Com título tomado de um dos mais impactantes trabalhos de Waldemar Cordeiro, a exposição Viva Maria dialoga de maneira pouco óbvia com o momento presente. Assim como a icônica obra, que exibe em letras garrafais a palavra “canalha”, os trabalhos que Maria Montero selecionou são de um escárnio cortante. Viva Maria! é também o título de um filme de 1965 do francês Louis Malle, em que Jeanne Moreau e Brigitte Bardot por acaso se tornam heroínas de uma revolução farsesca.
Em meio ao verdadeiro suspense quanto aos rumos do cenário social e político do Brasil no momento de realização da Copa do Mundo, a curadora reuniu trabalhos que lançam mão de ironia, ou mesmo de afiado cinismo, para indagar a realidade ou propor utopias.
Se a obra de Waldemar Cordeiro respondia, em 1966, à profunda crise institucional do país (que levou ao golpe militar e à ditadura), pode-se dizer que a curadoria desta Viva Maria se posiciona perante o debochado e provocativo bordão “imagina na Copa”. Longe de qualquer tese cristalizada sobre os acontecimentos, a seleção de trabalhos reflete a própria complexidade e indefinição do momento atual. Nas palavras da curadora, o conjunto pode ser lido como um “reflexo do espírito brasileiro, desgosto e esperança convivendo juntos e um senso de humor aguçado para driblar a situação”.
A obra Viva Maria de Waldemar Cordeiro – ironicamente – não compõe a exposição, mas é a provocação inicial da curadoria que inclui trabalhos de artistas brasileiros e dois estrangeiros. Além da presença literal do futebol em obras de Geraldo de Barros, a mostra propõe gerar ruídos em meio ao debate corrente, como no trabalho de Traplev, que instaura a galeria como espaço para um Novo Protesto (título de sua obra, apresentada na fachada do local). Já o mexicano Héctor Zamora sugere uma espécie de utopia, fator reiterado pelo fato de o trabalho ser um projeto não integrado à 27ª Bienal de São Paulo por algumas inviabilidades.
As mais diferentes formas de deboche ou ambiguidade surgem na exposição: desde obras pouco vistas do início da década de 70 de Regina Silveira até as sutis provocações do eslovaco Tobias Putrih em obras sobre jornal; ou então nos fragmentos narrativos de Fabiana de Barros & Michel Favre, que falam muito sobre a contemporaneidade, em interessante contraste com a forma pioneira como Thomaz Farkas fundiu registro documental e expressão artística – expediente que também ocorre em Corda, vídeo inédito de Pablo Lobato.
No embate entre produções históricas e contemporâneas, a exposição propõe uma reflexão aberta, inconclusa, sobre a crítica social na arte – no caso do Brasil, antes condicionada pela repressão e pela censura, e agora marcada por uma confusão ético-moral onde a corrupção domina e a crítica se faz por vozes dispersas. A curadoria incluiu, ainda, obras de Gustavo Speridião, Hudinilson Jr., Pedro Victor Brandão, Rafael RG, Rochelle Costi, Tiago Tebet e do escocês Michael White – que, assim como Tobias Putrih, mostra que o tema local pode ser lido de maneira interessante e pertinente também pelo olhar estrangeiro.
Período: de 7 de junho a 26 de julho de 2014
Horário: de terça a sábado, das 10 às 19h
Local: Luciana Brito Galeria
Endereço: Rua Gomes de Carvalho, 842 – Vila Olímpia
Tel: (11) 3842 0634
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