Sgt Pepper’s Lonely Hearts Club Band | Influente disco dos Beatles completa 46 anos de seu lançamento

Acho que até já disse isso por aqui, mas não custa repetir. Por mais que a gente ame uma banda ou um disco específico, não é tão fácil quanto parece dissertar sobre ele. A procura desenfreada pelas palavras perfeitas, a paranóia é efervescente. A expectativa é sempre diferente da realidade, mas não custa nada tentar.

A Frequência Não Modulada desta semana tem a honra, o enorme prazer de comemorar os 46 anos do lançamento de um disco que… UAU. Pode ser chamado apenas de disco? É um disco que quanto mais você fala sobre, mais você descobre o que falar sobre ele. Com vocês: o magnânimo, o influente disco dos Beatles: Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band: o álbum que tocava no Monte Olimpo, oh ok. Enquanto você lê o resto do post, o álbum completo:

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Se nossos ouvidos puderam se deleitar com o Sgt Pepper (os meus me enviaram chocolate, flores e uma carta “sealed with a kiss” como agradecimento, devo ressaltar), devemos nossa gratidão a outros dois discos da banda. Seria injusto não citá-los aqui. Estava tão óbvio quanto a aurora que os Beatles estavam em outra. Já consolidados como astros do rock, eles já tinham alcançado a plena liberdade artística desejada de mandar e desmandar em relação ao próprio trabalho. Nem precisava ser vidente pra sacar isso.

No ano de 1965, com o lançamento do disco Rubber Soul, já dava pra perceber que direção eles estavam tomando. O experimentalismo de Norwegian Wood com a cítara, por exemplo, e da composição madura do disco em geral. As canções de amor mimimis ainda existiam, mas não era só isso, sacam? No álbum seguinte, Revolver (1966), o divisor de águas, o flerte com novas sonoridades só continuaram. Não, eles não eram mais apenas “rostinhos bonitos”.

1966 foi um ano conturbado para eles. Depois da polêmica declaração de Lennon – os Beatles são mais populares que Jesus Cristo – muita gente protestou, queimou discos em praça pública, aquele fuzuê que todo mundo já sabe. A segurança não era lá essas coisas e entrar no palco e “concertar” já não era mais tão prazeroso. Os Beatles decidiram que não fariam mais turnês. O que por um lado foi bom, porque aí eles não sairiam do estúdio até ter algo realmente inovador. Essa exploração maior da tecnologia se deu graças a esse surto: “chega de shows”.

Em fevereiro de 1967, os Beatles lançaram o compacto com as canções Penny Lane e Strawberry Fields Forever. O single contendo essas duas ricas canções foi só um aperitivo – um agradável prelúdio – pelo que estava por vir. Eram, de longe, as músicas onde os Beatles, até então, mais exploraram as técnicas e as maravilhas do estúdio. Pra valer. Além dessas, Only A Northern Song foi gravada na mesma sessão de gravação, mas só viu a luz do dia em 1969, sendo lançada na trilha de Yellow Submarine.

Os Beach Boys, com seu disco Pet Sounds (1966), já tinham aproveitado essas técnicas ao máximo. Logo, a banda se sentiu desafiada a gravar alto a altura no ano seguinte. Só uma coisa: o solo de trompete de Penny Lane foi inspirado no Concerto de Brandenburg nº2 de Bach. Paul McCartney viu David Mason, integrante de um grupo chamado The New Philharmonia, tocando na BBC e o convidou pra tocar na faixa. E só foi inserido na canção depois que a mesma foi finalizada. Pop barroco total. Classe define. Arte encontra o pop e o convida pra um chá. Épico.

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Lançado a primeiro de junho de 1967, o Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band influenciou uma geração. Rico até no título e na arte da capa (feita por Peter Blake), foi com o Sgt. Pepper que eles alcançaram a plenitude artística: um disco tão ricamente produzido, tão mitológico que deveria estar exposto no Louvre. De acordo com a crítica especializada, claro (imparcialidade em primeiro lugar / aham, tá). Psicodélico e muito além de sua época, Sgt. Pepper foi um tapa na cara de jornalistas que, de acordo com Paul, riam deles dizendo que estavam curando a bebedeira.

Foram 4 meses de processo do álbum: aproximadamente 700 horas de gravação e o orçamento foi de US$ 75 mil. O disco era uma mistura louca de música clássica, jazz, fitas invertidas, música indiana e um Q a la Broadway. Além da faixa título, Fixing a Hole/ Getting Better/ Being For The Benefit Of Mr. Kite são extremamente teatrais, não só o instrumental como as letras. A reinvenção do rock na categoria de arte, cultuada e reverenciada no mundo inteiro. Só faltava emoldurar.

Originalmente a idéia era conceber um álbum conceitual, ou seja, com início, meio e fim, contando uma história. Mas apesar do estilo dos vocais e da produção de maneira geral sejam semelhantes, já na segunda música o disco perde, claramente, essa característica. A idéia veio praticamente toda do Paul, que apresentou os Beatles como outra banda: Banda do Clube de Corações Solitários do Sargento Pimenta”.

George Martin, produtor, e Lennon já disseram que o Sgt. Pepper não é conceitual mas não deixa de ser interpretado como se fosse por alguns fãs. Muitos lamentam o fato de Strawberry Fields Forever e Penny Lane não terem sido inseridas no Sgt. Pepper’s, porque soam muito como o resto do disco. No final, as canções foram inseridas no lado B da trilha sonora do Magical Mystery Tour, filme de 1967. A capa traz, junto aos Beatles, personalidades como Marilyn Monroe, Shirley Temple, Bob Dylan, Marlon Brando, Fred Astaire, Aleister Crowley, Karl Marx, etc. Lennon havia escolhido Hitler e Jesus para compor a capa também, mas, obviamente, não rolou. Por motivos óbvios.

Sgt. Pepper’s foi o primeiro álbum da banda (e o primeiro da história da música pop) a vir com as letras das músicas impressas no encarte. Na faixa título, Paul apresenta a nova banda e o vocalista Billy Shears [Ringo Starr], que canta na canção seguinte, With A Little Help From My Friends. Lucy in the Sky With Diamonds (LSD) foi banida da BBC por fazer alusão ao LSD. Lennon se justificou dizendo que a idéia pra música veio de um desenho que o filho (Julian) fez, o que de fato foi a inspiração. Mas um tempo depois, McCartney afirmou numa entrevista que eles estavam mesmo se referindo ao ácido lisérgico.

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She’s Leaving Home é, de longe, uma das canções mais bonitas do álbum e muito elogiada pelo ar erudito. Suas cordas clássicas e harpas são o pano de fundo para a história de uma jovem que abandona seu lar devido a pressão dos pais para viver com o namorado. História real, por sinal. Melanie Coe, uma adolescente londrina de 17 anos, tinha tudo. Menos liberdade. Paul se deparou com um artigo de jornal onde se lia o depoimento desesperado do pai da jovem: “não consigo imaginar porque ela fugiria: ela tem tudo aqui”. Estranho, não? Being for The Benefit of Mr. Kite, a sétima faixa do álbum, nasceu de um cartaz que anunciava as atrações de um circo, comprado em um antiquário retomando o ar circense com platéia e o burburinho da faixa-título. Lennon declarou que a música foi mais um “fiz a minha parte, abraços” no álbum.

Within You Without You foi a única composição de George Harrison para o álbum, representando o lado espiritual e místico no álbum. When I’m Sixty-Four é outra canção bem Broadway do álbum, bem “Cabaret” feelings. Em Lovely Rita, Paul homenageia as “metermaids”, termo inglês para controladoras de parquímetros. Good Morning, Good Morning foi inspirada num comercial de cereais que Lennon assistiu quando menino que conta de uma maneira irônica a felicidade que o músico sentia em começar um novo dia.

A Day in the Life foi encerramento do disco com maestria. Aos exatos 1:44 minutos da música, a orquestra começa a tomar forma, vai aumentando, aumentando de uma maneira cósmica. Até que, quando parece que o mundo vai acabar, o inesperado acontece: subitamente a orquestra se finda numa caída brusca ao piano, partindo daí para a segunda e intrigante parte da música. Brilhantemente ensurdecedor. Sabe aquela faixa onde não mediram esforços? Pois é.

Outra curiosidade interessante, pra finalizar: o uso de termos antiquados como “guaranteed to raise a smile”, “may I inquire discreetly”, “a splendid time is guaranteed for all” e etc dão ao disco aquele ar eduardiano. E, ainda assim, soava moderno. Tão pra frente. É… realmente isso é pra poucos. Demorou para as pessoas “digerirem” o disco, porque a mudança foi muito radical. Só ouvir os álbuns anteriores e notar as diferenças.

O disco se resume em 40 minutos de pura teatralidade e psicodelia explícitas. 46 anos e continua atual e altamente inspirador. Revolucionário e anos-luz a frente de seu tempo. Jamais será feito outro disco como ele. Sgt Pepper’s Lonely Hearts Club Band: redefiniu pra sempre a história da música pop.

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